Repugnava-a o toque. A proximidade física do agressor. O beijo indesejado. Mas sabia que era fundamental aparentar com excelência o êxtase. Respira fundo Anna, disse para si em surdina, falta pouco, muito pouco. Era essa esperança que a acalentava. A sede de vingança. Deixou a mente divagar para a sala dos fundos, para a tesão contida do seu grande amor, para a tortura psicológica que sabia lhe havia incutido em todos os poros do seu corpo, para a degradação mental sem retorno. O passado de abusos sexuais, não o deixaria escapar à loucura ao imaginar-se com desejo pela própria filha. A filha imaginária. Inexistente. O feto morto no vão das escadas do Hotel Papillon. Exultou com a ideia de o ver sofrer, de o ver pagar.
- Deixa-me foder-te Erika, roga-lhe Oddville, com a respiração entrecortada pelo desejo incontrolável.
- Então, então, caro Oddy, já sabes que não é esse o nosso jogo – responde-lhe com escárnio, ciente de o ter já ganho como joguete neste desafio pela morte.
- Não aguento mais, preciso de ti, continuava ele, ao mesmo tempo que lhe procurava levantar a saia, na tentativa vã de lhe arrancar as cuecas, e colocar-lhe o sexo a descoberto.
Afastou-se dele e despiu a camisa e a saia. Via-lhe o sexo erecto tal qual animal enclausurado em luta pela liberdade, ao dislumbre da sua semi nudez, e não pode deixar de sentir prazer. Apesar de todo o asco, excitava-a enormemente a imagem dum velho como Oddville a desejá-la com tamanha sofreguidão
- Despe-te, ordenou-lhe ao mesmo tempo que retirava da pasta Hermés, o chicote feito de crina de cavalo lusitano, oferta bondage do seu último amante. Um português. Cirurgião. Plástico. Horácio Quintanilha. O mesmo que a encontrou praticamente moribunda no quarto do hotel de Paris, aquele com os debruns cor de rosa. Aquele em que tinham deixado para morrer. Aquele em que o seu grande amor a tinha deixado para morrer. Foi Quintanilha que lhe restituiu a vida, a alma, o desejo, e a sede de vingança. Era um homem bom e por isso fácil de manipular. O seu fetiche sexual ajudava. Restitui-lhe também o rosto e o corpo como se os anos não tivessem passado, e foi ele que a renomeou de Erika. O mesmo nome, que anos antes havia escolhido para a filha que carregava no ventre. A filha por nascer. Coisas do destino ... ou não.
- Põe-te de quatro – ordenou com revigorada raiva a Oddvile.Olhou para a triste figura que se prostrava aos seus pés. E não conseguiu deixar de rir com prazer. Oddville todo nu, aos seus pés, como um cão, um cão não, não porque os cães são seres fiéis e companheiros. Um porco, sim um porco a chafurdar na merda. Sentia a raiva a crescer, e apoderar-se do pouco bom senso que ainda lhe restava. Tinha sido Oddville o mandante do seu assassinato, e era chegada a hora do retorno.
Chicoteou-o. Uma, duas, três vezes. O porco parecia gostar. Ordinário!
Sentou-se nas suas costas e ouviu-lhe o gemido de prazer. Acariciou as crinas rebeldes do chicote, e num movimento circular de mãos, rodeou-lhe o pescoço.
- Sabes Oddvile, soprou-lhe ao ouvido entre chupadelas que sabia lhe aumentavam a tesão - vou-te contar uma história. Uma história que te quero contar há muito. A mesma que esperas encontrar no ficheiro codificado que está no envelope cor parda. Comecemos pelo título, a ascensão e queda de Michael Oddville, agente do MI-5, continuava a sussurrar-lhe ao ouvido enquanto lenta e dolorosamente apertava nas mãos as crinas que torneavam o pescoço do seu pior inimigo, e o sentia a perder a vida.